quarta-feira, outubro 13, 2010

Economia do São João

Esse texto foi publicado na revista da Associação Cearense de Supermercados - ACESU.

Festas Juninas: Um bom negócio

Especialmente para os nordestinos, o mês de junho é bastante significativo, não só culturalmente, mas também economicamente. Enquanto a população se diverte com as festas, os cofres de empresas, produtoras e autônomos fica um pouco mais rechonchudo.

Por Angelo Tomasini

É tempo de tirar a roupa xadrez, o vestido de chita e o chapéu de palha do armário... O cheiro de bolo de milho, pé de moleque e paçoca já está no ar... Isso mesmo, chegou o São João. A data, principalmente no nordeste, representa um mês inteiro de festas com arraiás espalhados por todos os lados ao som de muito forró e no embalo das quadrilhas juninas.
O grande espetáculo da cultura popular brasileira movimenta milhares de pessoas em cidades pólo como Campina Grande, na Paraíba, Caruaru, em Pernambuco e mais recentemente em Mossoró, no Rio Grande do Norte, que surge como nova opção de festa junina no nordeste. Além das milhares de pessoas, também milhares de reais giram em torno da produção dos eventos e da comercialização de produtos em geral.
Aos poucos o comércio foi se aproximando do período festivo e se apropriando dos seus símbolos para melhor atrair o consumidor. Atualmente, já no final do mês de maio é fácil ver nos supermercados, padarias, lojas e até nas ruas, as famosas bandeirinhas, acompanhadas de balões decorando os espaços para atrair a freguesia. Alguns lojistas implementam com a música junina e o figurino dos vendedores a caráter.
Em uma loja de adereços e produtos descartáveis do mercado São Sebastião, no centro de Fortaleza, são centenas de produtos destinados à decoração junina. Eles vão do balão feito de material emborrachado (EVA) custando R$ 3 aos 10 metros de bandeirinhas feitos de TNT por R$ 4. O dono da loja, que não quis se identificar, disse que a procura começa no início do mês de maio, e que o faturamento nesse período é muito bom, chegando próximo ao do carnaval.

Expectativa
Muitos desses produtos vão parar nas ruas da cidade, em lojas e empresas. Os setores de marketing têm investido pesado em decoração, ofertas e propagandas. Signos da festa acabam se tornando estratégias para atrair os consumidores. Esse ano a Copa do Mundo de Futebol na África do Sul confere ao período um colorido especial e esperança de novos negócios.
A rede de supermercados Center Box, que teve um aumento de 20% nas vendas do período junino de 2009, espera um aumento de 10% nesse percentual para 2010. “Investimos em decorações temáticas, seguindo as tendências do mercado. Acreditamos que, além de atrair a atenção dos clientes, trás um ar de alegria e descontração também para os nossos colaboradores”, afirma Carol Ximenes, do setor de marketing.
Apesar de movimentar a população local, o São João não é o período de maior retorno para o setor supermercadista. Ainda segundo o marketing do Center Box, dia das mães e férias exercem maior influência sobre as vendas, além das festas de fim de ano. Flocos de milho, Milho verde, bolos sazonais, entre outros, são os principais produtos vendidos nessa época.
De acordo com o presidente da Associação Cearense de Supermercados (Acesul), Aníbal Feijó, o aumento nesse período não é o mais significativo. Em primeiro lugar está o natal, depois semana santa, carnaval e em seguida as festas juninas. Elas significam um aumento de 5%. “Nesse período são vendidos os ingredientes para fazer as comidas típicas. A farinha de trigo, ovo e leite saem bastante”, afirma.

Copa
Apostando na Copa, Ximenes, do Center Box, acredita que o evento também deve ser uma grande alavanca de vendas, elevando o percentual do período do ano passado, como já dito.
A Acesu também aposta no mundial de futebol da África do Sul, como diferencial nos números esse ano. “A copa vai mexer um pouco com o setor de bebidas e de ingredientes para tira gostos. Se os resultados forem bons para a seleção brasileira, para os supermercados também será. O percentual aí pode subir para 10%”, acredita Feijó.
Fabricantes de produtos relacionados diretamente ao período junino também comemoram as possibilidades de vendas. A maior fabricante de pipocas do país, Yoki Alimentos, também fabricante de flocos de milho e salgadinhos, espera para o período um ganho de 25% a mais do que no ano passado. A empresa já é responsável por 80% da produção de milho para micro-ondas e 40% de grão do mercado nacional.
Entrem os lançamentos para esse ano estão embalagens de linhas de pipocas e salgadinhos Yokitos. No clima do mundial elas recebem motivos especiais com os símbolos da competição e das cores da bandeira do país.

Quadrilhas Juninas
Como uma cadeia, os próximos a ganhar com isso são as lojas de tecido, que vendem tanto para os grupos de quadrilha como para colégios e para o publico em geral. De acordo com o gerente geral da Casablanca Tecidos, Airton Craveiro, todos os anos, a partir de abril começa o movimento dos grupos, comprando peças de tecidos como chita, cetim, microfibra e até organza. Eles devem compor o figurino a ser exibido nas apresentações.
Maio é quando as vendas estão mais aquecidas. “Temos nesse período um aumento de vendas de 15% devido às festas juninas. Esse é o segundo melhor período de vendas, perdendo apenas para o fim de ano”, admite. Esse ano com a copa do mundo, o grupo que possui seis lojas em Fortaleza pretende vender ainda mais.
Além das lojas de tecidos, os grupos de quadrilha junina também representam lucros para costureiras, sapateiros, músicos e outros profissionais que ajudam na montagem do espetáculo. A costureira Maria dos Santos, que fez boa parte do figurino da Quadrilha Estação Junina, no bairro Praia de Iracema, falou que apesar de dar um pouco de trabalho, o resultado financeiro compensa, assim como a satisfação de ver o seu trabalho elogiado durante as apresentações.
A produção do grupo envolve mais de 100 pessoas. São 40 pares, mais a banda regional que faz o acompanhamento musical ao vivo. Segundo a presidente da Estação Junina, Maria Noélia dos Santos, o orçamento desse ano passa dos R$ 30 mil. O figurino de um casal apenas, saiu por cerca de R$ 400. Na banda foram investidos cerca de R$ 5 mil.
E como esse grupo, são quase 300 em todo o estado, de acordo com dados da Federação das Quadrilhas Juninas do Ceará (Fequajuce), que atua na organização do movimento desde 1992. Apenas na capital estão mais da metade quadrilhas existentes.
Além dos movimentos informais para conseguir verba e financiar as apresentações, como bingos, rifas, festas e gincanas, os grupos contam também com os editais. Para 2010, o governo do estado disponibilizou R$ 900 mil através do edital XII Ceará Junino. Foram 78 projetos selecionados, sendo 20 de apoio a festivais de quadrilhas juninas e 58 a grupos de quadrilhas juninas. Para os festivais, um total de R$ 320 mil, onde cada um ganhou R$ 16 mil para custear a produção. Na categoria quadrilha junina, foram R$ 10 mil para cada grupo contemplado.
A prefeitura de Fortaleza abriu mais um edital para esse ano, contemplando grupos e festivais. O prêmio Festejos Juninos distribuiu R$ 350 mil entre 96 projetos. As 72 quadrilhas juninas classificadas receberam R$ 3,5 mil cada e os 24 festivais juninos receberam, valores entre R$ 6,5 mil, R$ 3,5mil e R$ 2 mil, dependendo da categoria.

Eventos
Apesar dos incentivos, a Federação dos Eventos Juninos e Culturais do Ceará (Fejuc) considera que esse ano não será tão bom para os festejos. Um dos motivos seria o mundial de futebol, que acaba levando uma fatia dos patrocinadores dos eventos. “No ano que tem copa ajuda a vender mais, mas acaba ofuscando um pouco as festas juninas. Os vendedores de comidas e bebidas aumentam o faturamento, mas as quadrilhas e os festejos têm menos espaço até na mídia”, lamenta o presidente da instituição, Aldenor Holanda.
Além da copa do mundo, ele também destaca que esse ano algumas prefeituras no interior do estado reduziram a quantidade de dias. Maracanaú, na região metropolitana de Fortaleza, por exemplo, que tinha um mês de festa, reduziu para dez dias. Em Juazeiro do norte, na região sul do estado, o evento que tinha 15 dias em média, contará com apenas sete em 2010. Ele acredita que o problema esteja em uma fiscalização mais rigorosa pelos órgãos públicos sobre os gastos nesses grandes eventos.
Mesmo com todos esses percalços Holanda diz que os festejos podem ficar quase no mesmo patamar do ano passado. São cerca de 250 eventos de grande, médio e pequeno porte em todo o Ceará. Desses, 100 são públicos, 150 particulares, da sociedade civil ou de pessoas físicas e 1 financiado e promovido pelo governo do estado.
O número de pessoas envolvidas e o número de empregos diretos e indiretos gerado também impressiona. Segundo o presidente da FEJUC, eventos pequenos de no máximo duas noites, envolvem em torno de 100 pessoas por dia. Desde barraqueiros a eletricistas e motoristas de ônibus e vans. Já em eventos de grande porte, com mais de uma semana, são mais de 1 mil empregos diretos e indiretos. “Em eventos que incluam também show de forró, com bandas tops como Aviões do Forró, chega a ter 30 mil empregos gerados por noite”, analisa.
Além dos empregos, os eventos movimentam milhões. Tomando como exemplo os festivais de quadrilhas em cidades do interior, onde além da competição das quadrilhas juninas acontecem também shows de forró e atrações em nível nacional, são investidos milhões. Esses recursos são oriundos do Ministério do Turismo e da Cultura. “Os eventos grandes trabalham com Emenda Parlamentar, por isso conseguem verbas maiores”, argumenta o presidente da Fejuc.

Foco no Marketing
Aproveitar-se das festas populares como estratégia de vendas não é novidade, mas cada vez mais uma realidade nos setores de marketing das empresas. Estudos na área comprovam que uma estratégia bem traçada utilizando símbolos e traços das festas da cultura popular podem trazer resultados positivos.
Expert no assunto, o paraibano Severino Alves de Lucena Filho, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), chegou a criar o termo “Folkmarketing” onde fala que os profissionais dessa área unem os meios de comunicação de massa e os valores da cultura popular, reinterpretando - os com o intuito de atrair os consumidores.
Esse objetivo, segundo ele no seu livro A festa junina em Campina Grande – PB: uma estratégia de folkmarketin, lançado em 2007 podem ser atingidos com “Interfaces no marketing local, que se caracteriza pela mobilização da memória coletiva; apropriação dos saberes da cultura popular; valoração do lugar como espaço da edificação e interpretação dos sentidos e a predominância da formação discursiva mercadológica e institucional”.
Para o mestre em marketing, professor da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Francisco Mirialdo Chaves Trigueiro, essas estratégias não são aplicadas apenas por grandes empresas. Em artigo sobre o assunto ele fala: “essas estratégias não são exclusivas das grandes empresas e de marcas reconhecidas do grande público, como também podem ser desenvolvidas por pequenas e médias empresas, como um supermercado de bairro, uma pequena indústria têxtil, lojas de rua dos mais diversos segmentos, como vestuário e eletrodomésticos. A atuação dos profissionais de marketing nesse cenário temático contribui para o aquecimento da economia, com o aumento do consumo e geração de emprego”.
Ainda de acordo com Trigueiro, “os canais de distribuição, especialmente o varejo, buscam atrair o público com ações de marketing praticadas em conjunto pelos fabricantes e atacadistas, como a preparação do ambiente de venda para o consumidor em um cenário que retrata a festa. Assim, o objetivo é fazer com que o cliente sinta o clima dentro da loja, com experiências sensoriais que vão de cartazes, folders, banners, exposição de ovos de páscoa no teto, em ilhas, com ações promocionais e de merchandising. Em relação à comunicação de marketing, a propaganda e promoção de vendas reforçam as estratégias, anunciando os produtos, marcas e pontos-de-venda”.
No caso específico do São João, “A comunicação de marketing das empresas se volta para os festejos com mensagens típicas do sertão e visual que retratam a geografia do lugar, como a caatinga e o estilo de vida da população. É um evento patrocinado por empresas, que têm como objetivo desenvolver ações de Relações Públicas e assim levar seus produtos e marcas institucionais para próximo do público-alvo e melhorar a imagem perante a sociedade”.

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